1. |
||||
MONDADEIRA
Tinha no olhar as espigas
e no cabelo uma fita encarnada
andava sozinha
na monda e a vida
pra ela era uma história encantada
Chapéu de palha e saia rodada
seu corpo planície que anoitecia
aind’ hoje me lembro
momentos que passámos
quando minh’ alma no seu peito dormia
Ai mondadeira
vem dar-me a mão
pela vida inteira
sem solidão
e o mar de campo
traz-me o teu suor
virgem primeira
lavra-me amor
Sua casa era um velho monte
onde morava sua simplicidade
seu pai já era velho
sua mãe havia morrido
e ela um dia partiu lá prá cidade
Com ela partilhei um milhão de sonhos
quando juntos ouvíamos o rouxinol cantar
mondadeira da minh’ alma
aind’ hoje recordo
quando naquele dia te vi passar
Ai mondadeira
vem dar-me a mão
pela vida inteira
sem solidão
e o mar de campo
traz-me o teu suor
virgem primeira
lavra-me amor
|
||||
2. |
||||
HORIZONTES PLANOS
Como quem lavra sementes
com o suor quente das mãos
sinto aqui o alentejo
no cansaço da solidão
Como quem olha ao redor
até onde a vista alcança
sinto no peito o calor
deste alentejo que é esperança
Ai sonho meu que foste ao longe
tentar a sorte perdida
dou graças pela minha vida
Ai sonho meu que foste ao longe
buscar a água sofrida
sê alentejo – seara e vida
Rego de sangue o alentejo
seco do som das ceifeiras
na calma que tanto desejo
ouço ao longe o som das ribeiras
Ai sonho meu que foste ao longe
tentar a sorte perdida
dou graças pela minha vida
Ai sonho meu que foste ao longe
buscar a água sofrida
sê alentejo – seara e vida
Ai sonho meu que foste ao longe
Sinto ao norte um gelo soturno
as mãos de um verde maduro
e se um dia o alentejo morrer
de sede cantada não há-de ser
|
||||
3. |
CANTILENA (Joao Cagado)
02:44
|
|||
CANTILENA
Dormem já as esperanças
enraízam-se os sonhos
Deliram as mãos que agarram as folhas verdes
do teu ventre
Despem-se os mitos
abraçam-se os poentes
e a dança das chuvas é cada vez mais real
é cada vez mais uma cantilena
que os pastores assobiam lá pelos montes
|
||||
4. |
||||
QUOTISTRESS
Ir sempre sem retorno
no forno da selva no trono da salva
que talvez salve o polvo
que roda à roda de si
povo sem rumo
ardendo no muro branco de tijolos
em punho num prumo incerto
em punho num prumo incerto
Incesto certo
que acerta no alvo
e na espiral final
das vidas sem concerto
e se inverto o papel
ridículo da personagem
no cubículo a taça das pálpebras
vai verter o liquido
baço falso ou não
E se um dia o sol se for
e a lua o quiser destronar,
há que pensarmos um pouco
no que ainda há pra acabar
Aiô aiô lá lá lá láie
Que faço que faço eu
da paixão no coração
e da solidão no vão da escada
escarpada reduzida a nada.
acordo e concordo
que tudo é fruto do acaso
no ocaso abrupto
da existência essência da vida.
E se um dia o sol se for
e a lua o quiser destronar,
há que pensarmos um pouco
no que ainda há pra acabar
Aiô aiô lá lá lá láie
|
||||
5. |
||||
SAUDADES DOS MONTES
Dei-te um laço de ternura
Bordado a fios de luar
Mesmo na noite mais escura
Vou ser capaz de te achar
Debaixo da oliveira
Não se pode namorar
Tem a folha miudinha
Deixa passar o luar
Deixa passar o luar
Não é como a laranjeira
Não se pode namorar
Debaixo da oliveira
Quem me dera ser colete
Quem me dera ser botão
Para andar agarradinho
Juntinho ao teu coração
Debaixo da oliveira
Não se pode namorar
Tem a folha miudinha
Deixa passar o luar
Deixa passar o luar
Não é como a laranjeira
Não se pode namorar
Debaixo da oliveira
Tenho saudades dos montes
Do lugar onde nasci
De beber água das fontes
De correr atrás de ti
De pintar o teu retrato
Em aguarelas de esperança
De ver as ondas do trigo
Até onde a vista alcança
|
||||
6. |
||||
CAMPOS AO SUL
Olho estes campos ao sul
trigo loiro que invento
sereno me embriago de azul
magia antiga que me traz o vento
Olho este trigo maduro
planície talhada no horizonte
as árvores recortam o futuro
de um verão que escalda nos montes
E quando no outono
o oiro povoa os caminhos
a seara é já um palheiro
onde te amo de mansinho
Serei a terra a brotar
o trigo seco e maduro
serei água a murmurar
no cansado silêncio do futuro
Serei o ar mais pesado
de um verão escaldante e denso
serei o fogo já cansado
a crepitar num pau de incenso
Olho estes campos sem fim
trigo maduro que envelhece
rouxinol que trago em mim
e no inverno me aquece
E quando no outono
o oiro povoa os caminhos
a seara é já um palheiro
onde te amo de mansinho
E quando o inverno chegar
e a chuva no matar a sede
amanhecerá primavera
plantando na planície o verde
Serei a terra a brotar
o trigo seco e maduro
serei água a murmurar
no cansado silêncio do futuro
Serei o ar mais pesado
de um verão escaldante e denso
serei o fogo já cansado
a crepitar num pau de incenso
|
||||
7. |
||||
PASTORELA
Ũa pastor se queixava
muit' estando noutro dia,
e sigo medês falava
e chorava e dezia
con amor que a forçava:
«par Deus, vi-t' en grave dia, ai amor!»
Ela s' estava queixando,
come molher con gram coita
e que a pesar, dêsde quando
nacera, non fôra doita,
por en dezia chorando!
«Tu non és se non mha coita, ai, amor!»
Coitas lhi davam amores,
que non lh' eran se non morte,
e deitou-s' antr' ũas flores
e disse con coita forte:
«Mal ti venha per u flores,
ca non es se non mha morte, ai, amor!»
|
||||
8. |
||||
MAR ALTO
E se soubesses de mim
e se inventasses o mar
se me tocasses por fim
davas ao sol este altar
Se inventássemos a flor
deitados abeira nar
voando talhando a cor
que ao longe enfeita o ar
Um barco navega ao longe ao longe
regressa sozinho do norte
e tu procuras e eu procuro
desesperadamente a sorte
E se eu soubesse de ti
e se desse outra cor ao luar
se te tocasse por fim
dava ao sol este mar
Havia uma paisagem imaginária
sozinha soerguendo-se no dia
Havia uma praia lendária
eterno repouso de minha agonia
Um barco navega ao longe ao longe
regressa sozinho do norte
e tu procuras e eu procuro
desesperadamente a sorte
|
||||
9. |
RETRATOS (Joao Cagado)
06:12
|
|||
RETRATOS
Vento norte
vento norte passageiro
traz lembranças doutras gentes
Trabalhando
trabalhando o dia inteiro
deitando à terra sementes
Pra colher
pra colher eterno estio
que navega entre o trigo
Vento norte
vento norte seco e frio
nosso medo é teu abrigo
É a dura vida
é a triste sina
eterna fadiga
que a terra nos ensina
Lá ao longe a guardar o gado
um pastor a olhar se esquece
cansaço calado
que a terra nos oferece
Ceifeiras ceifando a tristeza que cresce em mim
mulheres que cantam cantigas do principio ao fim
pastores olhando a calma onde à noite a terra chora
saudades desse futuro onde o tempo se demora
Madrugada
madrugada cresce cresce
até que o pastor se levante
Primavera
primavera sempre veste
seu vestido verdejante
É a dura vida
é a triste sina
eterna fadiga
que a terra nos ensina
Lá ao longe a guardar o gado
um pastor a olhar se esquece
cansaço calado
que a terra nos oferece
|
Streaming and Download help
If you like RETRATOS, you may also like:
Bandcamp Daily your guide to the world of Bandcamp